sábado, 17 de dezembro de 2011








EXCLUSÃO DIGITAL ZERO

Ao ler na edição 2215 do Jornal da Ciência a opinião da professora Marina Moraes Felipo da PUC-GO sobre o grave problema da exclusão digital de professores primários brasileiros senti-me livremente inspirado para também tecer alguns comentários sobre o assunto.

Ao solidarizar com a professora, quero dizer que concordo plenamente com sua opinião e idéias para combate a exclusão digital de professoras e professores primários, que bravamente cumprem a sua missão de alfabetizar milhões país afora. Penso, que se nossos alfabetizadores fossem digitalmente alfabetizados poderíamos começar a caminhar em direção ao longo caminho da exclusão digital zero. Explico.

Primeiro quero dizer que esse título foi livremente inspirado na cruzada presidencial para permitir que milhões de pessoas no Brasil tenham o direito ao pão de cada dia e na minha crença de que é perfeitamente possível saciar a fome de pão e também a de informação e bytes de milhões de crianças, professores e brasileiros do oiapoque ao chuí.

O sociólogo Sergio Amadeu da Silveira nos alerta em Exclusão Digital: A Miséria na Era da Informação (2001) sobre as desigualdades entre ricos e pobres quando o assunto é o acesso aos recursos da intenet, apontando como causas básicas dessa desigualdade o fato das pessoas nas classes populares estarem privadas de três instrumentos básicos: a linha telefônica, o computador e o provedor de acesso. Considera também a exclusão digital um veto cognitivo pois esta gera o analfabetismo digital, a lentidão na comunicação, o isolamento e o impedimento ao exercício da inteligência coletiva, isso vem corroborar com nossa idéia de que a escola pública é fundamental para promover uma inclusão digital capaz de proporcionar às classes populares os recursos necessários ao acesso a chamada sociedade da informação. Esperamos que tal inclusão, quando vier, seja democrática autônoma e cidadã.

Para tentar mostrar que promover tal inclusão não é tão difícil assim vamos, a exemplo da professora marina, sugerir algumas medidas que ao nosso ver poderão atacar em sua raiz esse mal que poderá comprometer de maneira determinante o futuro de nosso povo.

Quando escrevo e discuto sobre exclusão digital gosto sempre de lembrar que sempre temos que analisar projetos dessa natureza fazendo algumas perguntas: Quanto custa? De que servirá essa inclusão na melhoria e transformação prática da vida das pessoas? Enfim: a quem interessa essa inclusão? Penso, que por exemplo: Incluir digitalmente crianças, adolescentes, jovens e professores apenas para que os mesmos digam em casa que sabem usar um editor de texto uma planilha eletrônica ou conseguem entrar na internet uma vez na vida outra na morte, só servirá para alimentar o ciclo vicioso da dependência tecnológica e para gerar outro mal que poucos debatem mais já assola nossos rincões: o consumismo digital desnecessário, e, a dependência tecnológica, custa caro ao Brasil pois permite que poderosas empresas de Tecnologia da Informação continuem faturando bilhões e forçando padrões em nosso território.

Então, antes de sairmos instalando computadores em escolas apenas para atendermos aos PNUDs da vida faz-se necessário que nossos governantes avaliem melhor os efeitos colaterais dos ditos programas de inclusão digital e/ou de informática nas escolas, pois, senão correremos o risco de estarmos apenas formando mão-de-obra do tipo apertadores de botões para continuar a consumir produtos digitais que nos custam muito caro.


Em recente fala para professores da rede municipal de ensino de Ecoporanga-ES pude sentir na pele o que é a exclusão digital ou a inclusão digital tendenciosa e mal feita, mas lá, pude alertar em minha fala, sobre Software Livre na Escola pública: um Modelo Cidadão e Autônomo de Inclusão Digital, para os riscos e perigos dessa inclusão maléfica, no entanto, faz-se necessário que essas falas ganhem os corredores dos ministérios, das universidades, dos centros de pequisa, os fóruns de discussão na internet, e, que tais idéias tenham um pouco mais de recursos financeiros para que sua escala seja aumentada.

Mário Luiz Teza do Programa de Software Livre-BR, em um magnífico artigo entitulado Pão e Liberdade(2002) mostrou que a economia de recursos com a adoção de softwares livres pelos principais programas governamentais em Tecnologia da Informação poderia gerar dinheiro suficiente para bancar o Fome Zero quase em sua totalidade, dentre esses programas está o proinfo que julgo um dos mais importantes devido a sua importância estratégica tanto para a inclusão digital quanto para melhoria da qualidade do ensino público em nosso país. Porém fico desconfiado quando o vejo sendo usado apenas para promover uma inclusão tendenciosa, cara e não soberana.

Para finalizar gostaria de sugerir duas ações efetivas que poderiam contribuir de forma decisiva para iniciarmos um processo barato, autônomo e soberano de inclusão digital:

1) Que tal se Substituissemos as ferramentas em softwares e plataformas proprietárias do Proinfo por ferramentas e sistemas de código aberto, isso poderia contribuir, por exemplo para gerar empregos em muitas cidades brasileiras ao invés só em Seattle e no Vale do Silício.

2 Que tal o MEC e o Ministério da Ciência e Tecnologia incentivar a produção no Brasil do computador popular, já projetado por cientistas da UFMG e, depois presenteá-los (com software livre instalado, é claro) para cada professor primário país afora. A nação deve muito mais que um simples PC popular a eles... Mas isso é perfeitamente possível de se construir agora, basta vontade política. Os professores primários, a inclusão digital, a informática educativa e os progrmas de EAD através da internet agradecem.


Doriedson Alves de Almeida
Mestrando em Educação e Informática PPGE/UFES
Especialista em Educação a Distância – NEAD/IE/UFMT e NEAD/UFES
Especialista em Engenharia da Informação CT/UFES
Especialista em Informática Aplicada a Educação PUC-MG

Inclusão digital dos professores

A professora Adriana Cordeiro, há 13 anos na rede pública do Distrito Federal, conta que seu sobrinho de sete anos já sabe o que é o euro, a moeda vigente na União Européia. Intrigada, Adriana perguntou ao menino onde ele havia aprendido sobre o euro. Rapidamente, o garoto respondeu: “Na internet”. A professora chegou à conclusão que muitos alunos já estão mais adiantados do que educadores quanto ao uso das novas tecnologias digitais.
Para atender à demanda da inserção dos professores na era digital, foi lançado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nesta sexta-feira, 4, em Brasília, o Programa Computador Portátil para Professor, como parte da política de informatização das escolas brasileiras. Com o programa, os docentes poderão adquirir computadores portáteis a baixo custo — R$ 1 mil — e ter acesso a uma linha facilitada de financiamento. Os equipamentos serão em torno de 35% mais baratos que os disponíveis no mercado atualmente.
O ministro da Educação, Fernando Haddad, destaca que é importante cada professor adquirir seu equipamento, já que os 37 milhões de alunos da rede pública de escolas urbanas terão acesso à internet até 2010. Serão 56 mil escolas conectadas. “Com acesso à rede, o professor vai poder atualizar suas práticas pedagógicas, se valendo da tecnologia da informação para ensinar melhor”, explica o ministro.
Haddad ainda ressalta que com a aprovação do novo piso do magistério, de R$ 950, nenhum professor terá de comprometer mais do que cinco por cento do salário por dois anos para a aquisição do computador. “Mas para nós, do MEC, inclusão digital não é simplesmente disponibilizar equipamento conectado; envolve, também, a capacitação das pessoas e produção de conteúdos educacionais a serem utilizados pelos educadores”, afirma.
O secretário de Educação a Distância do MEC, Carlos Bielschowsky, explica que bancos e indústrias terão os próximos 30 dias para se cadastrar no programa. Em agosto, os professores podem começar a adquirir os computadores. Basta irem às agências dos correios ou dos bancos credenciados, escolher o modelo do equipamento e fazer a inscrição. Eles receberão os computadores em casa. “O objetivo de tudo isso é tornar a escola mais dinâmica, fazendo com que o professor tenha vontade de ensinar e o aluno, de aprender”, destaca.
Letícia Tancredi

sábado, 10 de dezembro de 2011

Ter computador é suficiente para inclusão digital?



Dr. Fernando Almeida, doutor em filosofia da PUC de São Paulo, responde a pergunta 'Ter computador é suficiente para a inclusão digital?' proposta pelo Jornal de Debates.

A conexão que faz a diferença

Especialistas alertam: adquirir equipamentos de ponta é muito mais fácil do que efetivamente se apropriar das novas possibilidades de construção do conhecimento

Dadas as dimensões continentais de nosso país, a tecnologia tem um papel fundamental na articulação de municípios longínquos, na troca de experiências e na construção de saberes que podem ser ministrados a distância. Para Fernando Almeida, ex-secretário municipal de Educação de São Paulo e responsável pela logística dos módulos não presenciais da Escola de Gestores, um programa do Ministério da Educação (MEC), a tecnologia é também uma forte aliada do diretor no cotidiano escolar: "Ela possibilita disponibilizar um grande número de dados com transparência, prestar contas, controlar as notas de alunos e a presença dos professores e permite que qualquer outra informação seja colocada em rede aberta." O domínio da internet e de programas de edição de texto, de apresentação de dados e de tabulações é parte importante dos cursos de reciclagem de diretores oferecidos no país.

Projeto Um Computador para Cada Aluno, em Porto Alegre: o que importa não é melhorar o ensino, mas a aprendizagem

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida, doutora em Educação e coordenadora do programa de Gestão Escolar e Tecnologias, desenvolvido pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, afirma que as escolas não exploram todo o potencial que a tecnologia oferece. "É nesse contexto que surge a importância da formação não só para o professor mas também para os funcionários, para que a tecnologia não seja utilizada só em sala de aula, mas faça parte do coletivo." Na prática, a especialista explica que é preciso que o educador atribua sentido aos equipamentos em seu trabalho. É só a partir do momento em que incorporamos as novas mídias que valorizamos seu uso (leia mais no quadro abaixo). "Temos hoje boas bases informatizadas que foram criadas pelas próprias Secretarias de Educação com o intuito de facilitar o acompanhamento de dados escolares, como desempenho de alunos, índices de aprovação e evasão. No entanto, de nada adianta o diretor alimentar essas bases se, quando alguém solicita alguma informação, ele acha mais fácil procurar num papelzinho." Léa Fagundes, coordenadora do Laboratório de Experiências Cognitivas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), é uma das pioneiras na pesquisa sobre a aplicação da tecnologia na Educação no Brasil.

Há mais de 20 anos, ela desenvolve projetos na área, como o programa Um Computador por Aluno, que consiste no uso de um laptop educativo por estudante matriculado em escola pública, além de seus educadores. Segundo ela, o problema é que os computadores, a programação deles, os sistemas digitais e suas possibilidades são pensados pela escola e pelos educadores para melhorar o ensino e não para melhorar a aprendizagem, ou seja: para conservar, não para transformar a escola. "Primeiro, tivemos os CAIs (sigla em inglês para Instrução Apoiada no Computador), depois os softwares educacionais, a seguir os CD-ROMs, os tutores inteligentes e, a grande novidade, os objetos de aprendizagem. Mas essas novas tecnologias de informação e comunicação não trazem problemas para os cidadãos e para a sociedade? Não estão a requerer mudanças de atitudes, desenvolvimento de novas competências e a vivência de valores éticos e morais?", questiona Léa. "Os alunos e professores precisam se apropriar da tecnologia tanto no que se refere ao uso do computador e da internet como de outras ferramentas de comunicação e informação", enfatiza.

Matéria publicado no site da Nova Escola: http://revistaescola.abril.com.br/gestao-escolar/diretor/conexao-faz-diferenca-mesmo-423635.shtml?page=all

Entrevista com Léa Fagundes sobre a inclusão digital

Entrevista com Léa Fagundes sobre a inclusão digital
Pioneira no uso da informática educacional no Brasil, Léa Fagundes cobra políticas públicas para o setor e defende a ajuda mútua entre professores e alunos

A sala de informática do Laboratório de Estudos Cognitivos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) abriga, entre vários computadores de última geração, alguns equipamentos sucateados. Embora não sejam tão antigos, esses micros parecem pré-históricos perto dos demais. A comparação entre as máquinas ajuda a perceber a rapidez vertiginosa com que a tecnologia se renova.

Nesse ambiente hi-tech, instalado no Instituto de Psicologia da UFRGS, a professora Léa da Cruz Fagundes recebeu a reportagem de ESCOLA para esta entrevista sobre inclusão digital. Precursora do uso da informática em sala de aula no Brasil, a presidenta da Fundação Pensamento Digital, de Porto Alegre, tem alcançado resultados animadores com as experiências que desenvolve em comunidades carentes do estado. Elas mostram que crianças pobres, alunas de escolas públicas em que não se depositam muitas expectativas, têm o mesmo desempenho que as mais favorecidas quando integradas no ciberespaço.

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Segundo a especialista, o caminho mais curto e eficaz para introduzir nossas escolas no mundo conectado passa pela curiosidade, pelo intercâmbio de idéias e pela cooperação mútua entre todos os agentes envolvidos no processo. Sem receitas preestabelecidas e os ranços da velha estrutura hierárquica que rege as relações entre professores e estudantes.

Léa defende a disseminação de softwares livres, sem custo e de fácil acesso pela internet. Consultora de programas federais que visam ampliar a inclusão digital nas escolas brasileiras, a professora pede mais seriedade à classe política: "Os projetos são iniciados e interrompidos periodicamente, pois as sucessivas administrações não se preocupam em dar suporte e continuidade a eles".

O que a senhora diria a um professor que nunca usou um computador e precisa incorporar essa ferramenta em sua rotina de trabalho?
Que não tenha medo de errar nem vergonha de dizer "não sei" quando estiver em frente a um micro. O computador não é um simples recurso pedagógico, mas um equipamento que pode se travestir em muitos outros e ajudar a construir mundos simbólicos. O professor só vai descobrir isso quando se deixar conduzir pela curiosidade, pelo prazer de inventar e de explorar as novidades, como fazem as crianças.

Como deve ser uma capacitação que ajude o professor a se adaptar a essas novas exigências?
É fundamental que a capacitação ofereça ao professor experiências de aprendizagem com as mesmas características das que ele terá de proporcionar aos alunos, futuros cidadãos da sociedade conectada. Isso pede que os responsáveis pela formação se apropriem de recursos tecnológicos e reformulem espaços, tempos e organizações curriculares. Nunca devem ser organizados cursos de introdução à microinformática, com apostilas e tutoriais. Esse modelo reforça concepções que precisam ser mudadas, como a de um curso com dados formalizados para consultar e memorizar. Em uma experiência desse tipo, o professor se vê como o profissional que transmite aos estudantes o que sabe. Se ele não entende de computação, como vai ensinar? Aprender é libertar-se das rotinas e cultivar o poder de pensar!

Que competências os educadores devem adquirir para utilizar com sucesso os recursos da informática?
Os professores em formação necessitam desenvolver competências de formular questões, equacionar problemas, lidar com a incerteza, testar hipóteses, planejar, desenvolver e documentar seus projetos de pesquisa. A prática e a reflexão sobre a própria prática são fundamentais para que os educadores possam dispor de amplas e variadas perspectivas pedagógicas em relação aos diferentes usos da informática na escola.

Onde o professor pode buscar informações sobre inclusão digital?
Ele pode visitar sites e participar de grupos de discussão. Consultar revistas especializadas e cadernos especiais dos jornais também ajuda muito. Outro caminho é buscar conhecimentos mais específicos com estudantes de escolas técnicas ou de cursos de graduação em informática e ouvir os próprios alunos.

É comum encontrar estudantes que têm mais familiaridade com a informática do que o professor. Como tirar proveito disso?
Transformando o jovem em um parceiro do adulto. Quando isso acontece, a relação educativa deixa de ser hierárquica e autoritária e passa a ser de reciprocidade e ajuda mútua. O educador não deve temer que o estudante o desrespeite. Ao contrário, o adolescente vai se sentir prestigiado por partilhar sua experiência e reconhecer a honestidade do professor que solicita sua ajuda. Esse fato é determinante para a criação de um mundo conectado.

A senhora coordena programas ligados à inclusão digital em escolas públicas. Que lições tirou dessa experiência?
Na década de 1980, descobri que o computador é um recurso "para pensar com", e que os alunos aprendem mais quando ensinam à máquina. Em escolas municipais de Novo Hamburgo, crianças programaram processadores de texto quando ainda não existiam os aplicativos do Windows, produziram textos de diferentes tipos, criaram protótipos em robótica e desenvolveram projetos gráficos. Hoje, encontro esses meninos em cursos de ciência da computação, mecatrônica, engenharia e outras áreas. Na Escola Parque, que atendia meninos de rua em Brasília, a informática refletiu na formação da garotada, melhorando sua auto-estima e evidenciando o desempenho de pessoas socialmente integradas. Alguns desses garotos foram contratados como professores e outros como técnicos.

Os alunos da rede pública têm o mesmo desempenho no uso da informática que os de escolas particulares e bem equipadas?
Sim. A tese de doutorado que defendi em 1986 me permitiu comprovar o funcionamento dos mecanismos cognitivos durante a construção de conhecimentos. Nos anos 1990 iniciei as experiências de conexão e confirmei uma das minhas hipóteses: as crianças pobres consideradas de pouca inteligência pelas escolas, quando se conectam e se comunicam no ciberespaço, apresentam as mesmas possibilidades de desenvolvimento que os alunos bem atendidos e saudáveis.

A educação brasileira pode vencer a exclusão digital?
Há excelentes condições para que isso aconteça. No Brasil já temos mais de 20 anos de estudos e experiências sobre a introdução de novas tecnologias digitais na escola pública. Esses dados estão disponíveis. O Ministério da Educação vem criando projetos nacionais com apoio da maioria dos estados, como o Programa Nacional de Informática Educativa (Proninfe) e o Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo). Muitas organizações sociais e comunitárias também colaboram nesse processo.

O que mais emperra o uso sistemático da informática nas escolas públicas?
A falta de continuidade dos programas existentes nas sucessivas administrações. Não se pode esperar que educadores e gestores tomem a iniciativa se o estado e a administração da educação não garantem a infra-estrutura nem sustentam técnica, financeira e politicamente o processo de inovação tecnológica.

Como o computador pode contribuir para a melhoria da educação?
Inclusão digital não é só o amplo acesso à tecnologia, mas a apropriação dela na resolução de problemas. Veja a questão dos baixos índices de alfabetização e de letramento, por exemplo. Uma solução para melhorá-los seria levar os alunos a sentir o poder de se comunicar rapidamente em grandes distâncias, ter idéias, expressá-las como autores e publicar seus escritos no mundo virtual.

Nossas escolas estão preparadas para utilizar plenamente os recursos computacionais?
A escola formal tem privilegiado essa concepção: é preciso preparar a pessoa para que ela aprenda. Mas o ser humano está sempre se desenvolvendo. Assim, as instituições também estão constantemente em processo. Por isso, a escola não precisa se preparar. Ela começa a praticar a inclusão digital quando incorpora em sua prática a idéia de que se educa aprendendo, quando usa os recursos tecnológicos experimentando, praticando a comunicação cooperativa, conectando-se. Mas algumas coisas ainda são necessárias. Conseguir alguns computadores é só o começo. Depois é preciso conectá-los à internet e desencadear um movimento interno de buscas e outro, externo, de trocas. Cabe ao professor, no entanto, acreditar que se aprende fazendo e sair da passividade da espera por cursos e por iniciativas da hierarquia administrativa.

Existe um padrão ideal de escola que usa a tecnologia em favor da aprendizagem?
Não é conveniente buscar padrões. Como sugeria Einstein, quando se trata de construir conhecimento é mais produtivo infringir as regras. O primeiro passo é reestruturar o espaço e o tempo escolares. Devemos dar condições para que os estudantes de idades e vivências diferentes se agrupem livremente, em lugares próximos ou distantes, mas com interesses e desejos semelhantes. Eles vão escolher o que desejam estudar. Essa liberdade definirá suas responsabilidades pelas próprias escolhas. Os professores orientarão o planejamento de forma interdisciplinar. Isso tudo é possível com o registro em ambiente magnético, que é de fácil consulta. Toda a produção pode ser publicada na internet, intercambiada e avaliada simultaneamente por professores de diferentes áreas.

Qual é sua avaliação sobre a proliferação de centros de educação a distância?
Nestes tempos de transição vamos conviver com projetos honestos e desonestos, alguns bem orientados e outros totalmente equivocados. O pior dos males é a voracidade do mercado explorador da educação a distância. Espero que a própria mídia tecnológica dissemine informações para o público interessado ter condições de analisar esses centros. É importante discriminar os cursos consistentes dos que "vendem ensino", ou seja, que reproduzem o ensino da transmissão, fora de contexto, em que o aluno memoriza sem compreender.

(publicado no site da Nova Escola - http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/planejamento-e-financiamento/podemos-vencer-exclusao-digital-425469.shtml)

Inclusão digital: o que é e a quem se destina?

termo “inclusão digital”, de tão usado, já se tornou um jargão. É comum ver empresas e governos falando em democratização do acesso e inclusão digital sem critérios e sem prestar atenção se a tal inclusão promove os efeitos desejados. O problema é que virou moda falar do assunto, ainda mais no Brasil, com tantas dificuldades – impostos, burocracia, educação – para facilitar o acesso aos computadores.

É que inclusão digital significa, antes de tudo, melhorar as condições de vida de uma determinada região ou comunidade com ajuda da tecnologia. A expressão nasceu do termo “digital divide”, que em inglês significa algo como “divisória digital”. Hoje, a depender do contexto, é comum ler expressões similares como democratização da informação, universalização da tecnologia e outras variantes parecidas e politicamente corretas.

Em termos concretos, incluir digitalmente não é apenas “alfabetizar” a pessoa em informática, mas também melhorar os quadros sociais a partir do manuseio dos computadores. Como fazer isso? Não apenas ensinando o bê–á–bá do informatiquês, mas mostrando como ela pode ganhar dinheiro e melhorar de vida com ajuda daquele monstrengo de bits e bytes que de vez em quando trava.

O erro de interpretação é comum, porque muita gente acha que incluir digitalmente é colocar computadores na frente das pessoas e apenas ensiná–las a usar Windows e pacotes de escritório. A analogia errônea tende a irritar os especialistas e ajuda a propagar cenários surreais da chamada inclusão digital, como é o caso de comunidades ou escolas que recebem computadores novinhos em folha, mas que nunca são utilizados porque não há telefone para conectar à internet ou porque faltam professores qualificados para repassar o conhecimento necessário.

Desde a década de 90, acadêmicos e especialistas em tecnologia da informação (TI) deram início a uma série de debates sobre um quadro preocupante e que pouco mudou: os países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, sobretudo os mais pobres, estão perdendo o bonde da informação. Sem os meios necessários (computadores e laboratórios) e recursos apropriados (internet rápida, telecomunicações), esses países deixam para trás um amplo leque de opções para aquecer a economia e melhorar os baixos índices sociais.

Somente colocar um computador na mão das pessoas ou vendê–lo a um preço menor não é, definitivamente, inclusão digital. É preciso ensiná–las a utilizá–lo em benefício próprio e coletivo. Induzir a inclusão social a partir da digital ainda é um cenário pouco estudado no Brasil, mas tem à frente os bons resultados obtidos pelo CDI no País, cujas ações são reconhecidas e elogiadas mundialmente. Inclusive, por vários estudiosos consultados pela reportagem, que costumam classificar as ações do Comitê como exemplo em palestras mundo afora.

O presidente do CDIPE, Marcelo Fernandes, acha que agora é o momento para reflexões e críticas às atividades desenvolvidas, pois o Comitê está completando dez anos. “Nestes últimos anos, tivemos muitas conquistas e desafios. Agora é o momento para refletirmos sobre eles e prestarmos conta para a sociedade sobre as ações que realizamos”, adianta. Apesar da boa vontade, alguns empecilhos representam um grave problema à melhor socialização de comunidades carentes.

O coordenador–executivo do CDI–PE, Diego Garcez, elege a carência de infra–estrutura como um dos piores obstáculos no Brasil e em Pernambuco. “Por exemplo, acontece de chegamos em uma comunidade de baixa renda e não termos como levar internet até lá, porque não há fiação telefônica ou instalação elétrica adequada,” cita.

Outro problema apontado por Garcez é a baixa escolaridade dos instrutores, que às vezes são os jovens da própria comunidade. E é justamente aí que entra o papel da inclusão digital como indutor à inclusão social. Chico Science já dizia que os computadores fazem arte. Os especialistas concordam e acrescentam: também fazem cidadania.

É preciso focar o crescimento social
Pensadores como Manuel Castells, um dos ícones nos estudos sociais a partir de novas tecnologias, pondera que a sociedade está passando por uma revolução informacional que pode ser comparada às grandes guinadas da História. Na clássica trilogia “A Era da Informação“, o autor é enfático em mesclar economia, cultura e informação a partir de uma inclusão digital de verdade.

Muitos imaginam que, em países pobres, não se deveria nem falar em inclusão digital enquanto há pessoas com fome e desempregadas na rua. O problema é que são as nações pobres as quais, justamente, costumam se beneficiar melhor das ações includentes.

Mark Warschauer, professor na Universidade da Califórnia e integrante do Centro de Estudos em TI e Organizações (CRITO, do inglês), descreve que em países como o Brasil, a inclusão digital precisa ser acentuada com mais prática e menos teoria.

O pensamento é compartilhado por William Mitchell, autor do livro E–Topia, que também se dedica a estudar o impacto social via inclusão digital. “Comunidades de baixa renda tendem a atrair menos investimentos em infra–estruturas de telecomunicações e tecnologias, gerando menos motivação de empresas e governos. Em lugares assim, há um risco óbvio de diminuir ainda mais as ofertas de bons empregos e serviços para todos daquela comunidade,” enfatiza Mitchell, em um cenário bastante conhecido no Brasil.

O professor Adilson Cabral, doutorando em Comunicação Social e estudioso do tema, considera até impreciso utilizar o termo inclusão digital atualmente, porque não mostra à sociedade o contexto social envolvido na questão. “Preferimos a idéia de apropriação social das tecnologias de informação e comunicação (TIC), cuja relação direta é a tomada de consciência e cidadania nas comunidades”, explica.

Ele critica a atuação de muitos laboratórios públicos de informática, alguns chamados de “telecentros”, porque muitas vezes os próprios organizadores não têm noção de objetivos e propósitos na hora de ensinar pessoas a usar o computador. “Não adianta apenas oferecer acesso à internet e editor de textos. A gente precisa transformar a perspectiva de vida das pessoas, buscar soluções práticas que melhorem a vida desses novos usuários”, sugere Cabral.

A crítica é compartilhada por Warschauer, que durante a última visita ao Brasil, ficou espantado com a falta de objetivos claros dos inúmeros telecentros instalados pelos governos nas cidades, especialmente em São Paulo, embora tenha elogiado bastante as atividades do CDI.

Computadores como fonte de renda e cidadania
Há uma série de iniciativas de inclusão digital que merecem destaque nos chamados “países pobres”, que ilustram como o acesso às tecnologias e uma pitada de boa vontade podem mudar um cenário de pobreza.

Em Honduras, uma ONG instalou estações de trabalho em comunidades rurais, cujos computadores funcionavam por energia solar, já que não havia energia elétrica naquela área. Também não havia infra–estrutura de telecomunicações, ou seja, nada de telefones ou conexões à internet. Então começaram a usar conexão via satélite, cujo valor ainda é bem alto. Ocorre que toda a parafernália pode se tornar auto–sustentável, com a própria comunidade arcando os custos de manutenção.

Após o pontapé inicial – ensinando as pessoas a usar as ferramentas e como tirar proveito delas – os agricultores e artesões começaram a vender seus trabalhos pela internet. Jovens da comunidade ainda conseguem usar salas de bate–papo para ensinar espanhol a europeus.

A Índia é um país–ícone quando se fala de tecnologia, mas é bom lembrar que também representa uma nação com terríveis índices de pobreza e desigualdade. Hoje, aquele país exporta software e exímios especialistas em tecnologia, cobiçados pelos países ricos e contratados a peso de ouro.

Parece incrível, mas os números sociais da Índia são piores do que no Brasil. De acordo com dados divulgados pelo governo, apenas 0,5% da Índia está conectada à web. Com uma população beirando um bilhão de pessoas, parece muita gente, mas em termos relativos está longe de chegar aos 11% que existe no Brasil, segundo o Ibope/ Netratings. No setor de telefonia, a Índia tem apenas 2,2 linhas telefônicas para cada cem habitantes, em média.

Outro exemplo é a Costa Rica, um país com a economia baseada em agricultura. Hoje, exporta mais circuitos integrados (chips) do que produtos agrícolas, uma situação impensável anos atrás. O país carrega o apelido de República do Silício, pois hospeda uma fábrica da Intel desde 1998.

Na época, a gigante dos processadores sondou o Brasil, mas impostos e burocracia fizeram a empresa procurar outro lugar – informação confirmada pelo próprio presidente da Intel, durante sua última visita ao Brasil. Em 1999, os chips da Intel já eram responsáveis por metade dos 8,4% de crescimento no PIB e por 37% das exportações costa–riquenhas. Uma façanha.

Tailândia, Filipinas, China, África do Sul. O ponto em comum entre as iniciativas é a mesma base: o computador é uma ótima diversão, mas também é uma fonte de renda e de cidadania. Mark Waschauer se mostra descrente, contudo, com o populismo que alguns governos de países em desenvolvimento fazem com a inclusão digital. Brasil incluso.

Entrevista: Mark Warschauer
Mark Warschauer é professor de Educação e de Informação & Ciência da Computação na Universidade da Califórnia, além de fazer parte do Centro de Estudos em Tecnologia da Informação e Organizações.

Há anos estudando o impacto social das ações de inclusão digital em países da América Latina, ele já esteve mais de uma vez no Brasil para conhecer as atividades do CDI, dos Telecentros em São Paulo e de outros projetos paralelos. Autor do livro “Tecnologia e Inclusão Social: repensando a divisória digital”, ele também edita o periódico Aprendizado de Linguagem & Tecnologia e nos concedeu esta entrevista exclusiva.

– Quais os projetos brasileiros de inclusão digital que você mais conhece?

- Para elaborar o livro, viajei para o Brasil e conheci bastante o Sampa.org, o CDI, o Projeto Clicar e alguns telecentros do Governo de São Paulo. Fiquei particularmente impressionado com o trabalho do CDI, pois há muita coisa ali que realmente funciona e são bem atraentes. Primeiro, porque eles estão conseguindo atingir locais e comunidades onde há, de fato, uma necessidade de inclusão digital. Segundo, conseguem recursos de várias fontes, induzindo à inclusão social de jovens pela digital.

- É possível falar em inclusão digital em um País como o Brasil, onde os índices sociais são baixos, a economia é desigual e o desemprego é gritante? Projetos de computadores populares, como ocorre há anos por aqui sem sair do papel, funcionam?

- Depende. Os projetos de inclusão digital são de extremo valor para melhorar esses índices, desde que coordenados de forma apropriada, sem populismos e sem discursos vazios. Por outro lado, a idéia tipicamente governamental de empurrar computadores em todas as casas pode ser um tiro no pé e gerar um efeito exatamente contrário à melhoria social. O Brasil não é a única nação do mundo a tentar fazer isso, então, deveriam olhar o que foi feito lá fora, em cenários semelhantes, para não cometerem os mesmos erros.

- Como assim?

- Empurrar computadores nas casas apenas com incentivos governamentais não é produtivo, porque o dinheiro investido na idéia poderia ser utilizado em projetos de economia social e desenvolvimento, os quais podem envolver tecnologia ou não. Mas vender computador por vender, independente do preço, não melhora a qualidade de vida de ninguém. O acesso à ferramenta [computador] é importante, porém, com um sentido mais amplo e coletivo de melhoria social.

- E qual seria a solução?

- O acesso às mídias digitais não é uma exclusividade da elite. Há vários caminhos de melhorar o cenário atual de exclusão, com relações custo/benefício razoáveis. A instalação de computadores nas escolas, por exemplo, é uma das alternativas que se mostraram mundialmente eficientes nos países em desenvolvimento – desde que seja levada a sério, com instrutores, equipamentos funcionando e diretrizes claras. São essas as grandes dificuldades. Em geral, o pessoal envia os computadores, discursa, sai no jornal e pronto. Cada um que se vire. Com diretrizes sérias, o aluno não apenas aprende o que tem que aprender na sala de aula, mas também sai da escola com um ofício. A longo prazo, é notória a inclusão social que ações assim podem gerar.

Projetos só mudam de nome
Em março deste ano, o Governo publicou no Diário Oficial da União o decreto que constitui a coordenação nacional do Casa Brasil, um projeto que reúne todas as iniciativas governamentais de inclusão digital. O problema é que as idéias por trás do Casa Brasil têm circulado desde 2003, sem nada concreto. Antes deles, projetos com nomes diferentes já existiam, sempre no papel.

É uma situação similar ao que ocorre com o projeto do PC Conectado, um computador popular para pessoas de baixa renda. O conceito não tem nada de novo. De acordo com informações da Agência Brasil, o projeto Casa Brasil de agora quer estabelecer as diretrizes e os critérios de seleção das localidades que serão beneficiadas com recursos federais, além de acompanhar a implementação.

Em entrevista à agência, o presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, Sérgio Amadeu, considerou o decreto como o reconhecimento que a inclusão digital deve ser uma política pública relevante. O Instituto é o maior parceiro do governo no PC Conectado, adiado pela terceira vez em apenas três meses. [Webinsider] (com Folha de Pernambuco)

Notícia publicada em: http://webinsider.uol.com.br/2005/05/12/inclusao-digital-o-que-e-e-a-quem-se-destina/